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Sharamanayas (15)

Atualizado: 30 de out. de 2018

Artigo 15: Do falar na congregação em língua desconhecida: É claramente contrário à Palavra de Deus e ao costume da Igreja Primitiva celebrar o culto público na Igreja, ou ministrar os sacramentos em língua que o povo não entenda.



Uma das belezas da Igreja Metodista é sua coerência doutrinária e histórica.

Imaginem que entre os metodistas é comum encontrar quem acredita que o 15 Artigo de Religião refere-se à inibição da manifestação do Dom mais comum do Espírito Santo, a “glossolalia” ou o “falar em línguas estranhas”. E pasmem, existem até entre esses, clérigos que defendem essa absurda tese, desconhecendo assim o metodismo histórico e a intenção do Artigo.


Como não é objetivo desse artigo tratar sobre o falar em “línguas estranhas”, mas sim celebrar o culto em outro idioma – no qual a congregação não consiga entender o culto e a Palavra –, apresento alguns fatos históricos para que possamos esclarecer o assunto aos irmãos e irmãs.


A tradição de falar em línguas tem sua raiz no protestantismo histórico e trouxe reflexos na “reforma religiosa” da Inglaterra (faço uso das aspas, pois as intenções do Rei Henrique 8º tiveram cunhos pessoais e políticos para a criação da Igreja da Inglaterra). Digo da raiz protestante, pois Lutero ao traduzir a Bíblia para o alemão teve como alvo trazer a liberdade aos/as cristãos e cristãs, um conhecimento bíblico que lhes dessem liberdade para conhecer as doutrinas elementares do evangelho, isso porque as leis da Igreja Católica estavam trazendo escravidão ao povo ao invés da liberdade proposta pelo Evangelho (um exemplo eram as indulgências). A Bíblia Sagrada até então não era de fácil acesso aos cristãos e cristãs. Para muitos, o acesso era apenas nos ofícios públicos e como eram ministrados em latim, nem todos compreendiam a língua.


Sola Scritura, segundo a Reforma Protestante, é o princípio no qual a Bíblia tem os princípios doutrinários para a vida do cristão e da cristã. Em 1520 Martinho Lutero enviou um escrito intitulado “A liberdade de um cristão” ao Papa em resposta a um pedido de que ele voltasse atrás de seus posicionamentos. Lutero declarou:

portanto, a menos que eu seja convencido pelo testemunho das Escrituras ou pelo mais claro raciocínio; a menos que eu seja persuadido por meio das passagens que citei; a menos que assim submetam minha consciência pela Palavra de Deus, não posso retratar-me e não me retratarei, pois é perigoso a um cristão falar contra a consciência. Aqui permaneço, não posso fazer outra coisa; Deus queira ajudar-me. Amém”.

E acrescentou a frase: “eu não me submeto a leis ao interpretar a palavra de Deus”. O historiador William Warren Sweet, em seu livro American Culture and Religion, menciona outra frase de Lutero: “sempre melhor ver com nossos próprios olhos do que com os olhos de outras pessoas”. O historiador sugere que essa declaração originou o direiro fundamental de liberdade religiosa.


Por mais que a Igreja da Inglaterra não tenha sua base inicial “protestante” no luteranismo ou calvinismo, algumas influências aconteceram e são inegáveis. A primeira declaração oficial da fé inglesa aconteceu em 1536 e era formada por Dez Artigos de Religião. As duas mudanças mais consideráveis foram na forma da estruturação e na liturgia. Agora é o monarca e não mais o Papa que é o cabeça da Igreja e os cultos teriam que ser em inglês e não mais em latim.


Em 1553, o Rei Eduardo 6º reformulou os Artigos de Religião que passaram a ser 42 com fortes influências calvinistas, uma vez que ele havia se casado com a sobrinha do reformador Andreas Osiander. Alguns teólogos do continente foram para a Inglaterra, o que ajudou na reforma dos artigos e na liturgia da Igreja da Inglaterra. A instabilidade da Igreja da Inglaterra aconteceu quando a Rainha Maria, irmã de Eduardo 6º, assumiu o poder abrindo novamente espaços para a Igreja Católica. Uma grande perseguição é iniciada contra o protestantismo e alguns teólogos são repatriados para o continente e três Bispos são mortos na fogueira: Cranmer, Latimer e Ridley. A repentina morte de Maria que reinou por dois anos, cede espaço para sua irmã Elizabete que assume o trono e fecha de vez as portas para o catolicismo. A consolidação do protestantismo na Inglaterra acontece com intensidade. As medidas parlamentares que estabeleceram a questão religiosa sob o Reinado de Eli­zabete usaram a Igreja de Henrique 8º como modelo e criaram a estrutura bási­ca da religião inglesa para as gerações seguintes. A esse respeito diz Richard P. Heitzenrater em seu livro Wesley e o povo chamado Metodista, p. 9:


“Um novo Ato de Suprema­cia (1559) colocou Elizabete como cabeça do Estado e “Governadora Supre­ma” da Igreja: palavras escolhidas com cuidado, que indicavam o reconheci­mento dos problemas enfrentados por Henrique quando se proclamou “ca­beça” da igreja (à luz de Ef 5.23 e Cl 1.18). O Ato de Uniformidade (1559) definiu os modelos para a liturgia e a doutrina, exigindo que as Igrejas usassem o Livro de Oração Comum (BCP), que o clero e outros oficiais· subscrevessem as doutrinas dos Trinta e Nove Artigos de Religião, e provi­denciassem uma exposição padronizada dos ensinamentos aceitos numa edi­ção ampliada do Livro de Homilias (para ser lido regularmente dos púlpitos, em todo o reino). Esses três recursos básicos de identidade teológica saíram anteriormente, uma década antes, da pena de Thomas Cranmer; o BCP e os Artigos foram levemente revisados a partir do Livro de Oração e dos Artigos da época de Eduardo, e as homilias tiveram o número dobrado desde a pri­meira edição feita em 1546”.

Os Artigos de Religião como são conhecidos, tiveram como inspiração os 39 de Elizabete dos quais Wesley compreendeu 25 deles para os metodistas.

Isso aconteceu em meados de 1784 quando Wesley ordena Richard Whatcoat e Thomas Vasey como pregadores e Thomas Coke como superintendente para os EUA. Ele preparou os Artigos de Religião e um livro de culto, o The Sunday Service of the Methodists in North América, para o uso dos metodistas nos EUA.


Em todas as reformas que os Artigos de Religião sofreram no decorrer das épocas, houve a reafirmação da liturgia do culto e sua celebração realizada em língua nativa. Assim, o “celebrar culto ou ministração de sacramentos em língua que não se conhece” é uma clara reprovação à prática litúrgica católica que celebrava, e ainda hoje o faz em algumas cerimônias, o culto em latim.

Nós metodistas acreditamos que toda celebração precisa ser ministrada em língua que o povo entenda, de modo que as pessoas possam ter acesso e entendimento do santo culto a Deus e a compreensão clara de Seus Sacramentos.
Eduardo Seixas Junior

Pastor na Igreja Metodista em São Roque e Superintendente do Distrito Sorocaba.



 

Bibliografia

COLEÇÃO DONS E MINISTÉRIOS. O que uma pessoa metodista é, sabe e faz? Editora Agentes da Missão, 2003.

HEITZENRATER, Richard P. Wesley e o povo chamado Metodista. 3ª ed. São Bernardo do Campo, Editeo.

RUNYON, Theodore. A Nova Criação: a teologia de João Wesley Hoje. São Bernardo do Campo, Editeo, 2002.

SALVADOR, José Gonçalves. Arminianismo e Metodismo. Subsídios para o estudo da história das doutrinas cristãs. São Paulo. Junta Geral de Educação Cristã da Igreja Metodista.

WEET, William W. American Culture and Religion.

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